Debates
19 de setembro de 2012

Segurança Metropolitana: Qual é o Papel dos Municípios na Prevenção da Criminalidade

Este evento buscou contribuir para a qualidade do debate neste ano de eleições municipais.

A Fundação Fernando Henrique Cardoso e a Fundação BRAVA se uniram para promover uma série de oito debates com acadêmicos e gestores que vivenciam a formulação e implementação de políticas públicas metropolitanas, e assim promover discussões sobre desafios e soluções para as grandes cidades brasileiras. A iniciativa busca contribuir para a qualidade do debate neste ano de eleições municipais. Além disso, pretende difundir exemplos, conhecimentos e inovações que melhorem a gestão pública nos próximos anos.

O sétimo debate, realizado no último dia 19 de setembro, procurou entender qual o papel que os municípios podem desempenhar na redução e prevenção da criminalidade. Afinal, conforme apontado pelo cientista político Leandro Piquet Carneiro e pelo sociólogo Claudio Beato, essa é uma questão que – passados mais de 20 anos desde a promulgação da Constituição de 1988 – continua sem respostas claras. E isso é especialmente crítico para as metrópoles e grandes cidades. Os dois especialistas têm opiniões distintas – ainda que não excludentes – sobre qual seria a melhor estratégia em relação à utilização das guardas municipais para a melhoria da segurança pública.

Para Piquet Carneiro, é necessário que as causas imediatas da desordem sejam atacadas. Isso porque, em ambientes degradados, a sensação de abandono do espaço público tende a incentivar comportamentos que deterioram ainda mais esses locais. Por essa razão, ele advoga a criação de uma “doutrina” de ordenamento urbano que seja pautada por padrões claros e possíveis de serem cumpridos pela população e fiscalizados pelas prefeituras, sem discriminar grupos sociais ou indivíduos específicos. Em outras palavras, comportamentos irregulares (e.g., tomar banho em chafarizes, defecar em locais públicos, praticar atividades comerciais proibidas, etc.) devem ser claramente definidos como tal e, independentemente de quem os pratique – se moradores de rua ou indivíduos abastados –, devem ser reprimidos pelas guardas municipais.

Um dos desafios à criação de um ordenamento urbano como esse é o fato de a Constituição permitir ao município apenas zelar por seu patrimônio, o que priva as guardas municipais de determinadas competências, como, por exemplo, o policiamento ostensivo. Frente a essa restrição, Piquet Carneiro vê com bons olhos uma proposta de emenda constitucional apresentada recentemente pelo senador Armando Monteiro. A proposição determina que seja dado ao município competência para a criação de áreas estratégicas de pacificação social e ordenamento urbano. As guardas municipais passariam a ter autoridade para o exercício de atividades de polícia ostensiva nos limites definidos em convênio com os Estados. A ideia é que, em toda e qualquer cidade, determinadas regiões são especiais – seja porque apresentam altas taxas de homicídio, porque agregam bens culturais, etc. – e apenas o próprio município possui o conhecimento necessário para identifica-las. A proposta é para que – exclusivamente nessas regiões – as guardas municipais exerçam atividades de polícia ostensiva, desde que autorizadas pelo poder estadual.

De acordo com Piquet Carneiro, a experiência do município do Rio de Janeiro demonstra que a proposta pode dar certo. Ali, nas áreas em que um convênio semelhante ao proposto pelo senador Armando Monteiro foi estabelecido, o governo do Estado – após constatar que a atuação das guardas municipais efetivamente contribuiu para a redução da criminalidade – acabou por retirar a polícia militar, realocando-a para outras áreas e atividades. Bruno Bondarovsky, subsecretário de planejamento da Secretaria de Ordem Pública da cidade do Rio de Janeiro, pontua que o sucesso da experiência carioca deve-se, entre outros fatores, à atuação diferenciada das guardas municipais nessas áreas especiais, conhecidas como unidades de ordem pública. Nelas, os guardas são responsáveis particularmente pela notificação de irregularidades – como, por exemplo, ambulantes em desacordo com a legislação e ocupação irregular de calçadas por bares – e por reportar aos órgãos competentes sobre problemas como calçadas quebradas, árvores que precisam de podas, lâmpadas de iluminação pública queimadas, existência de população de rua, etc.

Beato, por sua vez, dá menos ênfase às guardas municipais e mais ao papel que os municípios podem desempenhar na prevenção e redução da criminalidade. Inspirado pelo “Weed and Seed Project” – levado a cabo pela cidade de Boston –, ele defende que empoderar as comunidades locais é uma estratégia eficiente para o reestabelecimento da segurança pública em locais críticos. Para isso, seria necessário, em um primeiro momento, extirpar as “ervas daninhas” – como, por exemplo, grupos violentos – para, na sequência, plantar boas sementes. Em uma estratégia como essa, as prefeituras são atores centrais, pois, em relação às comunidades locais, possuem uma capilaridade e uma capacidade de aproximação que os poderes estaduais e federal não têm. Segundo Beato, tal capacidade é indispensável à cooperação entre o poder público e os cidadãos e, portanto, à retomada da ordem e à prevenção da criminalidade. Apesar das abordagens diferentes, Piquet Carneiro e Beato concordam que sucessos na área de segurança dependem fortemente de ações locais e da atuação das prefeituras, um aliado geralmente esquecido. Nesse sentido, as duas abordagens são antes complementares do que excludentes.