Programa Federal de Investimentos em Logística: onde estamos, para onde vamos?
Recebemos Hélcio Tokeshi, economista, diretor geral da Estruturadora Brasileira de Projetos até dezembro passado. Também participaram o advogado Carlos Ary Sundfeld e o economista Gesner Oliveira.
Para debater o Programa Nacional de Investimentos em Logística, lançado em agosto de 2012 pela presidente Dilma, a Fundação FHC, convidou, Hélcio Tokeshi, economista, diretor geral da Estruturadora Brasileira de Projetos até dezembro passado. A EBP é a responsável pela modelagem da maioria das recentes concessões federais de rodovias, portos e ferrovias. Comentaram a exposição de Tokeshi o advogado Carlos Ary Sundfeld e o economista Gesner Oliveira. O evento aconteceu no dia 3 de junho.
Em resposta às críticas sobre a lentidão do programa de concessões em infraestutura, Tokeshi buscou mostrar, com base em dados internacionais, que o atraso nos cronogramas e o aumento dos orçamentos de obras complexas de infraestrutura são mais comuns do que se supõe, sejam elas realizadas pelo setor público ou pelo setor privado. Sintomaticamente, essa parte de sua apresentação teve por título “Para evitar a autoflagelação”.
No balanço que fez do programa, o ex-diretor geral da EBP diferenciou cada um dos setores abarcados. Destacou as concessões dos aeroportos (seis desde o lançamento do programa: São Gonçalo do Amarante; Guarulhos, Viracopos e Brasília; Galeão e Confins). Além dos investimentos que já se iniciaram nos quatro primeiros aeroportos, incluídos nas duas rodadas iniciais de licitações, ele chamou a atenção para a melhor concepção do edital que regulou as licitações dos aeroportos do Galeão e Confins, concedidos à iniciativa privada ao final de 2013. Por essas razões, Tokeshi se disse otimista quanto à realização dos investimentos privados necessários à melhoria da infraestrutura aeroportuária do país.
O economista também se mostrou otimista com as futuras concessões de rodovias federais (desde 2012, sete trechos já foram concedidos ao setor privado), por acreditar que o modelo das licitações está bem concebido. Em 2014, o governo colocou em consulta pública os editais de mais quatro trechos. Em um dos slides apresentados, Tokeshi indicou que os consórcios vencedores arremataram os trechos com propostas que trazem implícitas taxas internas de retorno inferiores ao dos editais. Com isso, fez contraponto à crítica de que o governo vem forçando remuneração muito baixa ao investimento e assim afugentando o setor privado.
Já no caso das ferrovias, o otimismo do ex-diretor geral da EBP é bem menor. O ambicioso programa de construção de mais de 10 mil km novos de ferrovias continua na estaca zero. O modelo apresentado pelo governo não anima o setor privado. Mesmo a ferrovia mais atraente aos empresários, chamada Ferrovia de Integração do Centro-Oeste, cujo traçado atravessa uma área próspera de produção de grãos, do Sul de Goiás ao Norte de Tocantins, ainda não saiu do papel, depois de sucessivos anúncios de adiamento da publicação do edital.
Também no setor portuário, reconheceu Tokeshi, as concessões não deslancharam. O novo marco regulatório para o setor, aprovado pelo Congresso em novembro de 2012, dividiu o setor privado. O ex-diretor geral da EBP ressaltou os aspectos positivos das novas regras, em particular o fim da proibição aos terminais privados para movimentar cargas de terceiros e a permissão para investimentos em infraestrutura portuária fora dos portos organizados. Por ora, no entanto, o governo não conseguiu realizar licitações sob o novo marco regulatório, entre outras razões porque o Tribunal de Contas da União levantou objeções ainda não superadas.
Em que pesem esses tropeços, Tokeshi acredita que o país avança na regulação do investimento privado em infraestrutura. Para sustentar a sua afirmação, expôs, com algum detalhe, as características de contratos de concessão assinados no período mais recente, que a seu ver conciliam o estímulo ao investimento privado com o interesse público de assegurar uma oferta maior e melhor de serviços a empresas e cidadãos.
Gésner de Oliveira concordou que tem havido avanços na definição das regras do jogo, com resultados palpáveis, embora iniciais. Reforçando um ponto já levantado por Tokeshi, assinalou ser crescente o entendimento, entre investidores e governo, sobre qual deva ser o principal objeto dos contratos de concessão: mais do que as obras em si, os serviços a serem prestados, com ganhos de qualidade e produtividade para a sociedade.
O economista, porém, disse não ser pequeno o tamanho do desafio enfrentado pelo Brasil. O país investe pouco mais de 2% do PIB em infraestrutura, o que mal dá para manter a qualidade da que já existe. Segundo Gesner, deveríamos elevar esse percentual para 5%, se quisermos sustentar um crescimento econômico mais expressivo do que o alcançado nos últimos quatro anos. Esse salto dependerá de uma mobilização de investimentos privados muito maior do que jamais se conseguiu realizar no Brasil. No regime militar, isso se fez. Mas o responsável quase exclusivo foi o Estado, que pouca atenção dava à época às demandas sociais.
Falando em seguida, Carlos Ary Sundfeld manifestou sua preocupação com a insegurança jurídica e o decorrente desestímulo ao investimento privado em infraestrutura, em que pesem os avanços apontados por Tokeshi. Atribuiu o problema ao abandono, nos últimos anos, do princípio de “mínimo regulatório”, que governou o programa de privatizações e concessões públicas nos anos 90. Um dos principais responsáveis pelas leis que regeram a desestatização das telecomunicações no governo FHC, Sundfeld definiu o “mínimo regulatório” como um conjunto limitado, claro e estável de regras que compatibilize os objetivos dos investidores com os interesses da sociedade. Finalizou ressaltando que o princípio é indissociável da existência de agências regulatórias independentes e tecnicamente capacitadas, responsáveis pela aplicação das regras de jogo estabelecidas.