A Espanha e a crise na Europa: uma visão de dentro
Nosso convidado foi Narcís Serra, vice-primeiro-ministro espanhol do último governo de Felipe González.
É improvável que a atual crise financeira pela qual passam a Espanha e grande parte da Europa leve à morte do euro, mas o desfecho dessa história ainda é incerto. Essa é a opinião de Narcís Serra, apresentada em seminário promovido pela Fundação FHC em 20 de março de 2013.
Segundo o vice-primeiro-ministro espanhol do último governo de Felipe González, a política defendida pela Alemanha – austeridade fiscal e reformas estruturais– tem-se mostrado autodestrutiva. Na Espanha, era o setor privado, e não o setor público, que estava muito endividado. Depois do estouro da bolha imobiliária, as empresas e as famílias deixaram de investir e consumir e estão digerindo as suas dívidas. Seria o momento de o Estado compensar a queda da atividade privada com mais gastos públicos. Mas as políticas de austeridade recomendam justamente o contrário. Com isso, a economia espanhola continua em recessão, a despeito de avanços na agenda de reformas estruturais, e o ajuste fiscal se torna cada vez mais penoso e politicamente insustentável.
Uma solução alternativa depende de um novo pacto político na Espanha e de uma mudança na atitude da Alemanha em relação à Europa. Nos últimos anos, boa parte da prosperidade alemã se alimentou das exportações para o resto dos membros da União Europeia. Teria chegado o momento de a relação se inverter. Para tanto, a Alemanha precisaria aceitar maior crescimento dos salários e maior inflação na sua própria economia. Isso aumentaria as exportações de países do Sul da Europa para a Alemanha e os ajudaria a sair da crise. Mas a Alemanha resiste a essa alternativa. Assim como resiste a se comprometer com a criação de títulos soberanos europeus que reduzissem o custo de financiamento dos países mais atingidos pela crise.
Narcís Serra afirmou que a Europa precisa de lideranças à altura do momento crítico que atravessa. Teme que, em lugar de uma mudança ordenada da política de austeridade, os governos do Sul da Europa – quaisquer que sejam eles – sejam tragados pela recusa de suas sociedades em aceitar mais do mesmo. Uma crise política e social em países como Espanha e Itália, na intensidade experimentada pela Grécia, poderia levar à insolvência desses países e ao que até pouco tempo parecia impensável: o fim do euro e da União Europeia como até aqui a conhecemos.
O político e economista espanhol, porém, acredita que a Europa acabará por fazer a coisa certa. A questão é o tempo. E o tempo, ao ver de Narcís Serra, está se esgotando, junto com a paciência social com as políticas de austeridade.