O Brasil na visão das lideranças públicas, com Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central
Em discussão neste debate: os desafios da economia brasileira diante do novo cenário internacional.
“O Banco Central do Brasil tem uma função a cumprir. Isso vale também para outras instituições da República, mas eu estou sentado na cadeira de presidente do BC. Tão melhor será para o país quanto mais as decisões do BC dependerem mais do arcabouço legal e institucional da política monetária do país e menos de quem é que está sentado lá. O papel desta quadra histórica de normalização das instituições e das relações institucionais passa por isso. Tenho uma meta muito clara, que foi determinada por um comando legal. Não é uma sugestão que me deram, mas uma determinação legal, e tenho muito apreço pelo Estado Democrático de Direito”, disse o economista Gabriel Galípolo, presidente do BC, em palestra na Fundação Fernando Henrique Cardoso.
Galípolo – que assumiu a Presidência do Banco Central do Brasil em janeiro de 2025 para um mandato de quatro anos – citou o economista suíço Claudio Borio, especialista em temas como estabilidade financeira, a relação entre crédito e ciclos econômicos e o papel dos bancos centrais: “Os países podem ter metas de inflação distintas, mas gosto muito da definição de Claudio Borio sobre o papel do Banco Central: fazer com que a inflação não seja um tema na vida das pessoas. O ideal é que a inflação esteja em um patamar tão baixo que não afete as decisões econômicas das empresas e das pessoas. O BC vai fazer o seu trabalho e perseguir a meta que lhe foi dada. Se receber de volta gritos ou elogios, isso deveria estar cada vez menos relacionado com a personalidade de quem está no comando.”
Em sua palestra, que começou com uma análise do cenário econômico internacional, com foco nos Estados Unidos sob governo Trump e seus impactos mundo afora, e continuou com uma explanação detalhada, baseada em gráficos, do cenário macroeconômico interno e da atuação recente do BC. Galípolo falou sobre o mercado de trabalho brasileiro – “o mais exuberante das últimas três décadas” – e das perspectivas da inflação e do crescimento econômico.

“Os dados de que dispomos mostram que estamos caminhando para uma suavização do crescimento econômico e uma convergência lenta para a meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (3% ao ano, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos). O cenário macroeconômico está melhor do que o desenhado pelo BC em dezembro de 2024, mas ainda não atingimos a meta e devemos trincar os dentes e aguentar taxas de juros mais restritivas por um período um pouco mais longo”, disse.
Galípolo defendeu a importância de ter a “devida humildade diante desse objeto chamado economia”: “É fundamental observar os dados, considerando que existem defasagens, e implementar as medidas adequadas de maneira consistente. O que não pode é tomar todos os comprimidos de uma vez só, nem interromper o tratamento.”

Galípolo comenta influência de Fernando Henrique Cardoso em sua formação
O palestrante lembrou que, como estudante de economia no início dos anos 2000, estudou duas obras do sociólogo Fernando Henrique Cardoso que tiveram grande repercussão ao serem lançadas na segunda metade dos anos 1960 e nas décadas seguintes: “Empresário industrial e desenvolvimento econômico no Brasil” (1964) e “Dependência e Desenvolvimento na América Latina” (1969), escrita a quatro mãos com o sociólogo chileno Enzo Faletto.
“Quando estudava economia na PUC-SP, debatíamos se havia contradição entre o que FHC havia escrito nos anos 1960 e o que estava acontecendo no mundo naquele início dos anos 2000, com o avanço da globalização. Como tratar a dimensão do nacional dentro de uma concepção mais tradicional no contexto de um sistema econômico caracterizado cada vez mais pela expansão da globalização? Creio que hoje estamos lidando de novo com essas contradições sobre o que é o nacional e o que é o internacional, mas com ainda maior complexidade. Ao mesmo tempo que temos um sistema econômico que foi muito exitoso em se globalizar, temos regimes jurídicos e de organizações sociais que se dão dentro de espaços nacionais. Esses conflitos estão bastante claros hoje tanto do ponto de vista de discussões sobre jurisdição quanto de questões de política econômica”, disse.
A palestra de Galípolo integra o ciclo “O Brasil na visão das lideranças públicas”, realizado pela Fundação FHC desde 2024. O ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, membro do Conselho desta Fundação, fez comentários e perguntas, assim como o cientista político Sergio Fausto, diretor geral da Fundação FHC.
Saiba como foi a palestra do ministro do STF Edson Fachin, que acaba de assumir a Presidência do Supremo Tribunal Federal.
Otávio Dias é editor de conteúdo da Fundação FHC. Jornalista especializado em política e assuntos internacionais, foi correspondente da Folha em Londres e editor do site estadao.com.br.