O Brasil na visão das lideranças públicas, com Tabata Amaral
“Está mais do que na hora de deixar de lado os absurdos da política e começarmos a debater uma agenda real para o Brasil”, disse a deputada federal Tabata Amaral neste debate promovido pela Fundação FHC.
Polarização e temas como anistia aos condenados pelo 8 de janeiro e PEC da Blindagem (aprovada pela Câmara dos Deputados e descartada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado) impedem a sociedade e os políticos de debaterem o que realmente importa para as pessoas e de construir o futuro do país: “Está mais do que na hora de deixar de lado os absurdos da política e começarmos a debater uma agenda real para o Brasil”, disse a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), ao participar do ciclo “O Brasil na visão das lideranças públicas”, na Fundação FHC.
Para Tabata, o caminho para superar a polarização é buscar soluções reais para problemas concretos: “Estou no meu segundo mandato de deputada federal, fui candidata a prefeita de São Paulo em 2022, e a forma como tenho conseguido romper a polarização que nos paralisa é falar do concreto. É assim que eu faço política e busco construir maioria em torno dos meus projetos na Câmara.”

Tabata teve papel relevante na elaboração e/ou aprovação de leis importantes aprovadas nos últimos anos como a lei do absorvente gratuito, que instituiu o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual (Dignidade Menstrual); o projeto de lei que deu origem ao programa Pé de Meia; o Marco Legal do Ensino Técnico; e o novo Fundeb, entre outros. “Estes são alguns projetos nos quais me envolvi como deputada federal. Conseguimos obter votos suficientes tanto nas bancadas de esquerda, de centro e de centro-direita porque estávamos falando de problemas concretos, que exigem soluções reais.”
“A política ainda tem a capacidade de mudar a vida das pessoas, menos do que a gente merece e menos do que deveria, mas tem. Se tivermos a capacidade de ir para o concreto e realizar coisas que mudem a vida delas, podemos mudar a percepção das pessoas sobre a política”, disse.
Segundo Tabata, os governantes do que ela chamou de “centro democrático” precisam ser melhores nas entregas de serviços à população. “Está faltando resolver problemas concretos das pessoas. É disso que se trata. O debate ideológico deve ser feito, eu jamais recuarei sobre os direitos LGBT, por exemplo, mas faço o debate em outras questões também, como o ensino técnico, a questão dos absorventes etc. Quando a gente tem um governo que entrega, faz toda a diferença.”
Democracia brasileira mostrou resiliência: estabilidade política pode ser um atrativo
Para a palestrante, as instituições brasileiras conseguiram defender a democracia dos constantes ataques sofridos nas eleições presidenciais de 2018 e 2022 e durante o governo Bolsonaro (2019-2022), culminando com a invasão das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023, em Brasília, já no início do governo Lula. Essa estabilidade política, apesar dos sobressaltos, pode ser um ativo para atrair investimentos estrangeiros para o país, com a condição de que eles desenvolvam setores da economia, criem empregos e melhorem de fato a vida das pessoas.
“Nesse mundo em convulsão em que estamos vivendo, o Brasil vai se manter estável, vai conseguir defender sua democracia? Vai conseguir se manter equidistante de Estados Unidos e China? Este pode ser um baita ativo para dizermos para empresas do mundo todo, venha construir Data Centers aqui porque água não será problema, energia renovável não será problema, instabilidades políticas e disrupções democráticas não serão um problema porque o Brasil é uma democracia e vai continuar a ser. Venha se instalar aqui, mas tem que ter contrapartida. Venha treinar força de trabalho, tem que ter um nível razoável de transferência de tecnologias e oportunidades para o desenvolvimento de empresas brasileiras”, disse.
Segundo a deputada, o Brasil está bem posicionado para enfrentar e ter maior protagonismo diante de alguns dos maiores desafios da atualidade – as mudanças climáticas, a revolução tecnológica e a crise das democracias e do multilateralismo –, mas precisa fazer a lição de casa. “Neste momento extremamente desafiador do mundo, parece que perdemos a capacidade de pensar e construir soluções de forma coletiva. Temos a maior floresta tropical do mundo, água doce em quantidade, recursos energéticos renováveis em abundância, uma população grande, diversa e criativa, boas relações com nossos vizinhos, enfim temos muito a oferecer. Só que não estamos usando essas posição para o bem do nosso povo.”
Durante a sua apresentação inicial de cerca de 30 minutos, a deputada falou sobre algumas de suas principais bandeiras no Parlamento, como o ensino técnico profissionalizante, o uso das tecnologias para melhorar os serviços públicos e a regulação das grandes plataformas de tecnologia que atuam no país.
“Soberania é a nossa capacidade de dizer como vamos viver coletivamente dentro do nosso país. Vamos abrir mão disso num contexto em que a vida acontece cada vez mais no ambiente digital e deixar as empresas globais de tecnologia definirem todas as regras? O povo brasileiro adora o WhatsApp, adora o Pix, produz uma quantidade absurda de dados, mas ao mesmo tempo é um dos que mais cai em fake news. Não venham dizer que quem é a favor da regulação é contra a liberdade de expressão. Isso é uma falsa dicotomia”, disse.

“Vou terminar minha fala inicial com uma frase do pernambucano Ariano Suassuna (1927-2014), que dizia que o otimista é um tolo, o pessimista é um chato, e bom mesmo é ser um realista esperançoso. Me vejo exatamente assim, como uma otimista esperançosa. É isso que me dá coragem para seguir disputando eleições no Brasil.”
“Durante muito tempo, não imaginávamos que o Brasil poderia ter como diferencial o fato de poder ser um país estável institucionalmente, politicamente, quem sabe até economicamente. Depois do período árduo pelo qual passamos nos últimos anos – em que essa possibilidade esteve em risco, mas o país soube resistir –, temos agora a chance de reforçar e consolidar essa estabilidade. Mas isso vai depender do Congresso, que pode colocar tudo a perder com essa proposta de anistia, e do resultado das eleições de 2026”, alertou o cientista político Cláudio Couto, professor da FGV EAESP, convidado a comentar a fala da deputada.
“Você apresentou uma série de propostas e soluções que se resumem a uma palavra: políticas públicas. Só com políticas públicas bem pensadas e aplicadas, encontraremos soluções práticas para problemas concretos”, disse Couto.
Missão do PSB é construir uma alternativa para o país
“Na sua visão, é possível mudar o quadro político do Brasil e em que medida? Quais são as perspectivas da eleição para o Congresso em 2026, não só do seu partido, o PSB (Partido Socialista Brasileiro), mas de um conjunto de partidos que não está nem na extrema direita nem nas práticas fisiológicas características do centrão?”, perguntou o cientista político Sergio Fausto, diretor geral da Fundação FHC.
“O PSB tem a missão de construir uma alternativa para o país. Enquanto Lula for candidato a presidente, nós vamos apoiá-lo porque ele é quem tem mais capacidade para enfrentar a extrema direita e nós não vamos entrar em aventuras. Mas quem vai pegar o bastão da centro-esquerda depois do Lula? Nós do PSB nos posicionamos mais ao centro do que o PT, sobretudo na economia e na segurança pública. Estamos fazendo nossa renovação, tanto em termos de agenda como de novas lideranças políticas. Em 2026, nosso grande desafio é aumentar nossa bancada no Congresso e eleger mais governadores”, respondeu Tabata.

Segundo Tabata, o tema da soberania nacional será relevante nas eleições de 2026: “Este será um tema global nos próximos anos porque a soberania está sendo atacada de diversas formas, e não só no Brasil. A esquerda errou no passado quando não abraçou a defesa da soberania, e a direita ocupou esse espaço. Agora, com a atuação de Eduardo Bolsonaro junto ao governo Trump contra o Brasil, a extrema direita está abrindo mão da bandeira da soberania em prol dos interesses do clã Bolsonaro. Esta é a hora do centro democrático ir pra cima e reconquistar esse espaço.”
“Uma das características do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em sua longa vida pública foi a de buscar dar rumo e sentido de direção ao país. O que fazer, como olhar para frente, a partir dos desafios do presente? E foi isso que você nos trouxe hoje. Você tem rumo, tem sentido de direção e isso é muito positivo”, disse o ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer, presidente do Conselho da Fundação FHC, para Tabata, no final da palestra.
Saiba mais:
Ciclo “O Brasil na visão das lideranças públicas”, com o prefeito de Recife, João Campos
Ciclo “O Brasil na visão das lideranças públicas”, com Gilberto Kassab, presidente do PSD
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Otávio Dias é editor de conteúdo da Fundação FHC. Jornalista especializado em política e assuntos internacionais, foi correspondente da Folha em Londres e editor do site estadao.com.br.